Opinião

O que ganha o filho de dona Lindu metendo-se em briga alheia?

Sobre o silêncio de Lula na hora em que Bolsonaro e os militares afrontam o Supremo Tribunal Federal

Por Ricardo Noblat

Eurídice Ferreira de Melo, conhecida como dona Lindu, nasceu e morreu analfabeta, mas aprendeu com a vida e ensinou aos filhos a não se meter em brigas sem necessidade. Lula não vê nenhuma no momento que o obrigue a interferir no conflito entre Bolsonaro e os militares, e o Supremo Tribunal Federal.

Sente-se credor dos dois lados, não devedor. Os militares, por exemplo, pressionaram o Supremo para que negasse a Lula em 2018 o habeas-corpus que lhe permitiria recorrer em liberdade da condenação decretada pelo juiz Sérgio Moro. Intimidado, o Supremo negou o habeas-corpus por 6 votos contra 5.

De resto, o conflito com o Supremo só interessa a Bolsonaro e à sua turma. Bolsonaro escolheu a via do confronto com o Supremo para, se perder em outubro, alegar que a eleição foi fraudada e que por isso não reconhecerá os resultados. Por que fazer o jogo de Bolsonaro pautando-se por suas escolhas?

Juristas dizem a Lula que a maioria dos ministros do Supremo, por ora, ainda não sabe como reagir à afronta de Bolsonaro que concedeu perdão ao deputado Daniel Silveira (PTB-RJ), condenado a 8 anos e 9 meses de prisão por atos hostis à democracia. Se eles não sabem como reagir, por que Lula saberia?

Não partiu de Lula a sugestão de convidar os militares a darem palpite na reforma das urnas eletrônicas para torná-las mais seguras. A má ideia partiu do Tribunal Superior Eleitoral. É falsa a tese de que as Forças Armadas, como instituição, tem direito a opinar sobre esse assunto. Só Bolsonaro tira proveito disso.

Há outro fato que explica o silêncio de Lula. Em 2010, a Itália pediu e o Supremo concedeu a extradição do terrorista Cesare Battisti, acusado de 4 homicídios na década de 70 quando era militante de um grupo de esquerda. Battisti estava preso no Brasil. Pois no último dia do seu governo, Lula concedeu-lhe refúgio.

Nunca na história do país até então, um presidente deixara de cumprir uma decisão do Supremo de tal natureza. Solto, Battisti, 9 anos depois, foi preso na Bolívia, extraditado para a Itália, e lá, finalmente, confessou seus crimes. A Justiça italiana confirmou sua condenação à prisão perpétua.

Ricardo Noblat é jornalista

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *