Opinião

De volta à normalidade, mas falta punir os militares golpistas

Feliz e entediante 2024

Por Ricardo Noblat

2023 começou animado. No dia 1º de janeiro, depois de empossado, Lula subiu a rampa do Palácio do Planalto na companhia de um menino de 10 anos, uma catadora de lixo, um índio, um metalúrgico, um professor, uma cozinheira, um artesão e um homem que teve paralisia cerebral. Sim, não faltaram Janja, a primeira-dama, e a cadelinha Resistência, adotada pelo casal. Foi bonita a festa, pá.

 

Coube à catadora, filha e neta de catadores, vestir em Lula a faixa presidencial. Quem deveria fazê-lo, você sabe, escapara para os Estados Unidos dois dias antes, ele e suas joias roubadas. Fugiu à sua obrigação. Preferiu assistir de longe, imaginando-se a salvo de suspeitas, o que aconteceria sete dias depois – a tentativa fracassada de um golpe cívico-militar para depor aquele que o derrotara.

Nada no ano que termina hoje se compara em matéria de animação com que aconteceu em Brasília no 8º de janeiro, e que chocou o mundo. E nem se pode dizer que foi algo surpreendente. O golpe foi planejado a sol a pino, cantado em prosa e verso nas plataformas digitais e transmitido em tempo real. Tinha até um nome: “A festa da Selma”. Deu errado porque Lula não chamou uma GLO.

 

Operação de Garantia da Lei e da Ordem (Op GLO) é uma operação militar determinada pelo presidente da República e conduzida pelas Forças Armadas de forma episódica, em área previamente estabelecida e por tempo limitado, e que tem por objetivo a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio público. Aplicava-se perfeitamente à situação.

Lula decretou intervenção federal no Distrito Federal. Com a GLO, ele teria posto seu destino nas mãos dos militares que lhe ofereceram tal saída já redigida, à espera tão somente de sua assinatura. Com intervenção e a escolha de um interventor de sua confiança, Lula manteve o controle das coisas. “Selma” é alusão à saudação “Selva, adotada pelas Forças Armadas do Brasil.

 

O momento de maior risco para a democracia será lembrado pelas autoridades dos Três Poderes no próximo dia 8. A quase totalidade dos governadores bolsonaristas convidados não deverá comparecer – e não se sabe por que, uma vez que todos se dizem democratas de berço e juraram respeito eterno à Constituição. Verdade que Bolsonaro também jurou, mas só da boca para fora.

O resto do ano de 2023 foi sem graça. Nenhuma previsão de catástrofe se confirmou. O desemprego diminuiu fortemente ao invés de aumentar. A inflação caiu. O poder aquisitivo do brasileiro aumentou. Os militares voltaram impunes aos quartéis – esse é o único fator de preocupação. Um governo tido como de esquerda e um Congresso de direita acabaram se entendendo no principal. Uma chatice só.

Talvez por isso ou apesar disso, a satisfação dos moradores do Brasil em morar no país saltou de 59% para 74% em um ano, enquanto o sentimento de orgulho de ser brasileiro passou de 77% para 83%, segundo pesquisa do Datafolha. Ambas as marcas se aproximam do teto registrado na série histórica, iniciada no ano 2000 pelo instituto. Consideram o Brasil um local ruim para viver apenas 8%.

De volta, portanto, à normalidade entediante. De volta um governo que começou bem e que se esforça para entregar o que prometeu. Feliz Ano Novo para todos – menos para os que ainda sonham em virar a mesa. Esses, que vão direto para o inferno.

Ricardo Noblat é jornalista

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