Opinião

Faça como seus canários, Anderson Torres: abra o bico e cante

Ex-ministro da Justiça de Bolsonaro diz querer colaborar para esclarecer o golpe do 8 de janeiro

Ex-Ministro da Justiça, Anderson TorresIgo Estrela/Metrópoles

A sabedoria popular ensina que suicídio anunciado não se consuma. Quem pretende matar-se ou se mata ou se arrepende, mas não anuncia. Há casos registrados no Brasil de pessoas que ameaçaram pular do alto de prédios, e como desistiram, acabaram vaiadas por multidões que aguardavam o desfecho.

Cearenses já vaiaram o sol quando ele apareceu em meio a nuvens carregadas de chuvas. Aconteceu em 30 de janeiro de 1942 na Praça do Ferreira, no centro de Fortaleza. O mundo estava em meio à 2ª Guerra Mundial, e o Nordeste esperava a passagem do Dia de São José, em 19 de março, para saber se o ano seria de seca ou não.

Era um tempo em que os mais velhos observavam os sinais da natureza para antecipar o que viria. Se o pau d’arco não florisse, o jabuti não pusesse ovos e o pássaro “joão-de-barro” fizesse sua casa com a porta virada para a nascente, com toda certeza seria mais um ano da seca que periodicamente flagelava a região desde a época do Império.

Anderson Torres, ex-ministro da Justiça do governo Bolsonaro, preso há mais de 100 dias em um batalhão da Polícia Militar do Distrito Federal, suspeito de envolvimento no golpe fracassado de 8 de janeiro último, arrisca-se a não ser mais levado a sério de tanto repetir para os que o visitam que irá se matar caso não seja solto. Vaiado não será.

Seu mais recente visitante foi o deputado federal de primeiro mandato Ubiratan Antunes Sanderson (PL-RS), um policial e presidente da Comissão de Segurança Pública da Câmara. Sanderson esteve com ele ontem à tarde, e à saída gravou um vídeo onde diz que a situação de Torres “é assustadora e muito triste”.

Segundo o deputado, o ex-ministro “está absolutamente abalado psicologicamente, não só por estar há mais de 3 meses preso, mas por estar sofrendo uma grande injustiça. Chorou todo o período em que estive com ele; nada tem a ver com o golpe, quer colaborar para que tudo seja esclarecido, e chegou a falar em suicídio”.

Nada impede Torres de colaborar com a justiça que investiga atos hostis à democracia como os de 8 de janeiro. Torres sabe exatamente o que fazer. Colecionador de pássaros, amante dos seus cantos, para ser solto basta que imite um dos seus canários: abra o bico e cante tudo o que sabe. O país lhe será grato.

Ricardo Noblat é jornalista

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